Petição | A excepção cultural não é negociável

Vão ter início as negociações entre a Europa e os Estados Unidos da América sobre um novo tratado de comércio. Os cineastas europeus, liderados pelos realizadores belgas Luc e Jean-Pierre Dardenne, lançaram uma importante petição que procura excluir o audiovisual e os serviços cinematográficos dessas negociações e do futuro acordo. Esta petição, cujo texto em português abaixo se reproduz, surge em resposta à minuta do mandato de negociação que a Comissão Europeia propôs que os Estados Membros adoptassem. Os cineastas chamam a atenção para o facto da Comissão Europeia não poder abdicar dos seus compromissos em favor da cultura e tornar a excepção cultural num instrumento de negociação. O audiovisual e os serviços cinematográficos devem ser excluídos do mandato, sendo este um pré-requisito para a preservação de politicas que apoiam a diversidade cultural na Europa. A SPA, enquanto membro do Comité Executivo do Conselho Internacional dos Criadores Dramáticos e Audiovisuais, junta a sua voz ao apelo do Presidente daquele órgão da CISAC, apelando aos autores e aos cidadãos portugueses em geral para que apoiem massivamente a petição apresentada pelos cineastas europeus, o que poderá ser feito através do seguinte link: Assine aqui a petição

Texto em Português da Petição:A excepção cultural não é negociável!  O dia 13 de Março de 2013 pode tornar-se um ponto de viragem importante (e escandaloso) na construção europeia. Foi nesse dia que a Comissão Europeia decidiu passar por cima do princípio da excepção cultural e adoptar uma minuta de mandato para negociação que inclui os serviços de audiovisual e de cinema nas negociações comerciais UE-EUA que deverão começar este Verão. Caíram no esquecimento as palavras entusiastas proferidas pelo Presidente Barroso em 2005: “numa escala de valores, a cultura vem antes da economia”. Esquecidas ficaram também as declarações de amor pelo cinema feitas pelo Presidente Barroso quando os realizadores foram forçados a agir em defesa do programa MEDIA. E o que aconteceu ao lema da Comissão “A Europa Ama o Cinema”? A alguns meses do fim do seu mandato como Presidente da Comissão Europeia, não percebemos que marca quer Barroso deixar na história europeia. Infelizmente, por agora, predomina uma imagem destrutiva: a imagem daquele que desistiu da cultura. Durão Barroso parece ter-se esquecido da sua própria lição, relativamente recente: “a cultura deveria ser a nossa resposta para a crise”. Vamos ser francos: o mandato para negociar que foi proposto é uma renúncia. É uma capitulação e um ponto de ruptura. Há 20 anos atrás, a vontade comum de apoiar a criação e promover a sua diversidade teve origem aqui na Europa. A cultura é um elemento central para a identidade e para os ideais europeus. Há 20 anos atrás, a excepção cultural irrompeu na cena internacional, levando ao reconhecimento de um estatuto específico para as obras audiovisuais, por não serem apenas bens comerciais iguais aos outros, e terem por isso de ser excluídas das negociações comerciais. Há 20 anos atrás, graças à excepção cultural que emergiu da negociação do Acordo Geral sobre o Comércio e Serviços (GATS), a criação e diversidade linguística puderam continuar a beneficiar das normas criadas para as proteger e apoiar. O resultado é positivo: a diversidade cultural é agora uma realidade na maior parte da Europa, permitindo o intercâmbio cultural e o entendimento mútuo, e sendo, além disso, um vector de crescimento e de criação de postos de trabalho. A Europa que amamos esforçou-se arduamente para tornar a Convenção sobre a Protecção e Promoção da Diversidade de Expressões Culturais da UNESCO, de 2005, uma realidade. A Europa que amamos ratificou esta Convenção em conjunto com 126 países de todo o mundo. A Europa que amamos é admirada no mundo inteiro porque impulsionou e apoiou esta importante iniciativa. Com a adopção do mandato para negociação, que reduziria a cultura a nada mais do que uma mercadoria, a Comissão Europeia (excepto os três comissários que votaram contra) abandonou a sua posição favorável à excepção cultural, indo dessa forma contra os seus próprios objectivos e compromissos anteriores, e demonstrando uma terrível duplicidade.

Detestamos esta Europa que está pronta a desfazer-se dos princípios da Convenção, em particular o princípio da soberania cultural dos Estados. Face aos Estados Unidos, onde a indústria do entretenimento é a segunda maior fonte de exportações, a liberalização do sector audiovisual e do cinema levará à destruição de tudo o que até agora protegia, promovia e ajudava a desenvolver as culturas europeias. Esta política, aliada à concessão de benefícios fiscais excessivos aos líderes do mercado digital dos EUA, assemelha-se de forma notória a um desejo consciente de pôr a cultura europeia de joelhos. Aqueles que, em nome da Europa, tiverem aceitado esta renúncia serão para sempre culpados aos olhos da história. A diversidade cultural não deve ser apenas mais um instrumento de negociação. Deve continuar a ser uma ambição, uma reivindicação legítima e um compromisso. Ainda não é demasiado tarde! Nós vamos continuar a lutar pela capacidade da Europa para escrever a sua história na perspectiva da diversidade dos seus povos e culturas, e pela capacidade dos cidadãos europeus para encontrar respostas profundas e complexas aos desafios actuais. Os signatários, provenientes de toda a Europa, apelam solenemente a todos os chefes de Estado para apoiarem a exclusão dos serviços de audiovisual e de cinema das negociações comerciais UE-EUA.

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